Quarta-feira 02 de janeiro de 2019. O novo ano chega pronto para se estabelecer. Até ontem emissoras de rádio e televisão estiveram nos impingindo retrospectivas do ano que se despediu e aí pudemos, ao vivo e à cores, nos confrontar com incidentes e acidentes ocorridos em 2018, aqui e no mundo!
Eu quero mais, sinto necessidade de rever e relembrar flagrantes registrados comigo e com um sem número de pessoas (entidades eu diria) que povoaram — por todos esses dez anos que tenho vivido neste Lar — meus pensamentos e minha atenção ao fato de que estou vivo, por causa de todas e cada uma delas.
Aí interrompo tudo. Paro tudo por que uma notícia explode pelos corredores. Bem agora fico sabendo que o companheiro Miguel Alonso dos Santos, antigo morador da Casa e que até ontem recolhia os recipientes das mesas do refeitório, deixados após o jantar, acaba de falecer.
Os médicos socorristas da Empresa que procede os atendimentos emergenciais daqui do Lar, haviam sido chamados para atendê-lo em uma crise de mal súbito e, estão se retirando agora após assisti-lo, deixando-nos com a dolorosa notícia de que ele não resistiu a um episódio de parada cardiorrespiratória…
Agora volto ao computador e já é noitinha são 19:50. Acabamos de jantar e eu não consigo deixar de lembrar o acontecido e, principalmente não consigo deixar de lembrar do Miguel, do falecido, companheiro e amigo desde que aqui vim morar. A música que ouço agora é “Petit Fleur” (pequena flor). Nem sei por que ela me transporta para o gordo, surdo e mudo que havia acabado de nos deixar!
Ao entrar nesta Instituição há 10 anos, eu o fiz – meio contra a vontade de meus dois filhos – pela necessidade de suprir um espaço (cratera enorme) vazio que vinha se apoderando da minha realidade de idoso com 72 anos, aposentado e separado de uma companheira.
Nem imaginam como e quanto aprendi… e continuo aprendendo neste ambiente tão heterogêneo com seres tão distintos entre si. Muito tenho escrito por aqui, por este Blog, fazendo denúncias do meu espanto, estarrecimento mesmo, quanto a similaridade das coisas e pessoas – que aqui moram ou se dedicam aos que aqui moram – com as outras muitas pessoas que encenam seus papéis no teatro social de fora desses muros.
A minha sensação é a de que anda faltando disciplina. Wikipédia (Internet) me esclarece:
Disciplina é a obediência ao conjunto de regras e normas que são estabelecidos por determinado grupo. Também pode se referir ao cumprimento de responsabilidades específicas de cada pessoa.
Do ponto de vista social, a disciplina ainda representa a boa conduta do indivíduo, ou seja, a característica da pessoa que cumpre as ordens existentes na sociedade.Neste aspecto, o oposto de disciplina é a indisciplina, quando há a falta de ordem, regra, comportamento ou de respeito pelos regulamentos.
Manter a disciplina ainda pode estar relacionado com o ato de ser constante, ou seja, se dedicar no cumprimento de determinada tarefa para o alcance de um objetivo final, por exemplo. Aliás, ter disciplina no trabalho é fundamental para o bom desempenho de qualquer profissional.
O DISCIPLINADO Miguel, tornou-se responsável por uma enorme fatia de bons conhecimentos e prática, neste meu aprendizado de fim de vida. Mudo e surdo! Então só lhe restava sabiamente conduzir-se pelas normas e regulamentos. Persegui-los mesmo. O bom senso, naturalmente o obteve das observações da própria vida e resultados havidos.
Somos mais de uma centena de moradores com algumas dezenas de funcionários, muitos visitantes e trabalhadores voluntários, terapeutas, técnicos e gestores.
Da mesma forma que pude retirar do falecido, em dez anos, subsídios para me sentir até um pouco orgulhoso do que tenho conseguido ser e fazer ou deixar de fazer pela boa causa desse Lar dos Idosos Recanto Tarumã…; faço minha convocação a cada um dos que que aqui moram ou por aqui orbitam, que procure ser, assim como Miguel Alonso dos Santos, um ser bem mais…
…DISCIPLINADO
Meus sentimentos Mano Jura!!!